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Tom de noite

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As cortinas azuis dançavam ao vento quando entramos no quarto, o vento cortava os meus cabelos e as suas mãos me causavam arrepios que até então eram desconhecidos pelo meu corpo. A falta de fala constante, não por timidez, mas pelo medo de sentir algo que fizesse minhas crenças e promessas serem quebradas. Eu disse e repeti nãos tantas vezes que os sins já não faziam sentido a minha boca, mas eu queria, ah, como eu queria, eu te quis inteiro e você fez com que a minha alma voasse em pedaços por entre as paredes do escuro dos seus olhos. Olhos fechados, eu e você em uma dança sem fundamentos, em uma dança que apenas nós sabemos dançar, juntos, esquizofrênicos e sem iniciativa de final. No calor dos corpos eu me perdi e me encontrei quando tirou meus pés do chão, já não quero tocar o solo, você me deu asas e me fez livre dentro de um quarto com tranca. Me aperta, me cala. Dentes, lábios e língua. O silêncio que eu fiz questão de preservar enquanto meu corpo desejava gritar, ...

Insônia.

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A canção que ecoa em meu peito grita sobre sua inconstância. Serena, confusa, desaquieta toda a paz que um dia fez morada. A falta, os dias que se arrastam em estações; o trem já passou, sem passageiros, o barulho em festa só aumenta. Me acorda em meio a sussurros; e o vento corta meus pensamentos. O sono e a calmaria já se foram, só me resta a lembrança da estrada, a fumaça nos trilhos e a linda Árvore de Maçãs.

Choque Anafilático

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O frio na barriga de viver, traçar um novo caminho e se sentir pulando de paraquedas todas as vezes que a vida te lembra que há um quarto vazio te esperando, quarto esse que ainda é muito grande pra você, que não te aconchega e não te deixa dormir. E você, dando voltas por ele se pergunta se não devia ter ficado dentro do seu aconchego. Lágrimas.  O peso do mundo. Todo o peso do seu mundo sobre os ombros. Mais lágrimas. Nenhuma certeza, mas a coragem te sopra e faz você andar pra frente, seguir tentando. Milhões de sinapses acontecendo descontroladas, o frio na pele e os choques elétricos que percorrem todo o seu corpo. Já te disseram que liberdade dói às vezes? Mas saiba que às vezes só a solidão conforta. Você apaga a luz e senta no canto mais escuro do cômodo, relembra as histórias que você já não sabe se foram reais. Eram pra ser, eram pra te fazer sorrir, mas não fazem, elas te apavoram. Apavoram por você não saber mais quando parará de contar o tem...

Olhe nos meus olhos.

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O ruído dos aparelhos respiratórios me incomodava, cada apito me fazia imaginar uma parada cardíaca e toda aquela confusão que se forma.  Desfibrilador, morfina, MONAU, mais oxigênio.  Aprendi palavras novas esses dias, palavras que não faziam parte do vocabulário de um escritor de livros infantis.  KPC, paciente de isolamento, sonda nasogástrica, mais oxigênio. Já não sei mais o que marca o calendário, mas o tic tac do relógio só me faz entender que os dias não passam.  Gasometria, teste de consistências, queda de saturação, mais oxigênio.  Os enfermeiros correm, os médicos correm, a Fono me dá comida, mas ninguém olha nos meus olhos.  Família? 1 hora por dia, mas eu não falo e eles tem deixado de vir, nem um “a” e ninguém olha nos meus olhos.  Dosagem de magnésio, SARA, AMBU, mais oxigênio.  Eu queria música, queria as palavras nas pontas dos meus dedos, mas eu já não me mexo, quero meus livros e o cheiro da grama recém cor...

Sóror

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Ela mudou o espelho de lugar e me disse que era pro meu bem, segurou a minha mão e jurou de pés juntinhos que era minha amiga. Acredito no bom coração das pessoas, mais do que deveria, acredito que as pessoas mudam porque eu mudei, que elas crescem, que tudo pode ser conversado. Mas não pode. Eu acredito quando as pessoas sorriem e me perguntam se estou bem. Eu só não sabia que a pergunta era na esperança de eu responder um sonoro NÃO. Desculpa se algum dia eu te disse algo ruim, mas me diminuir não vai fazer você ser uma pessoa melhor, me colocar pra baixo não faz com que você fique no topo da pirâmide alimentar. Não é normal que você olhe pra mim e me diga todos os defeitos que eu nem sabia que tinha só pra que você se sinta bem. Alguém já te disse que somos iguais? Nós somos, sofremos as mesmas pressões, somos igualmente menores diante a sociedade estruturada para que sejamos massacradas por tudo e todos. Já não basta sermos menores diante deles? Você tem real...

Crise de ausência

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Hoje eu senti sua falta, depois de muito tempo o seu sorriso tomou o meu corpo e eu soube que essa paixão nunca vai me abandonar. Eu me desculpo comigo por isso e sei que não mereço esse tipo de amor, que eu sou maior que isso, que o meu destino é outro e que eu não quero viver do seu lado, não desse jeito, não do jeito que você me deixou. Quando você saiu eu já sabia que o portão nunca mais se abriria pra você, nem pra visitas. E mesmo querendo, eu não pedi pra você ficar. Algo dentro de mim agradece por você ir, o meu caminho não andaria aos seus passos e você sabe disso. Me pediram pra pensar em uma lembrança boa e você foi a primeira coisa que me veio a mente. O geladinho do seu nariz no meu, as suas mãos quentes e as covinhas mais lindas que eu já conheci. Eles chamam de paixão, o meu coração pula e em um ímpeto nega. No fim, eu sei que é só uma lembrança boa, só mais um bilhete que tem seu cheiro e seu gosto, mas que nunca chegará ao seu endereço.

Particípio Passado

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Na rua você disse que me amava e em menos de 5 minutos, logo depois de meio copo de tequila cuspiu o passado na minha cara. Um shot e um tiro, meia dúzia de palavras que me fizeram chover por dentro. Quem sou eu pra dizer que você está errado?  Eu nunca estou certa não é mesmo?  É o que eles dizem. Essa menina, que nem tamanho tem, pode falar que ela aguenta, mas não toca que ela quebra. Bonequinha de porcelana, bate, mas pede desculpas que ela se refaz sozinha. É mulher, tem que aprender a se refazer, a subir no salto e dar o sorriso mais lindo que ela guarda.  Foi o álcool, ele não gosta de interpretação de textos, foi você que entendeu errado. O passado que eu bebi e dividi com algumas pessoas naquela rua fria, engoli lembrando das aulas de português e do porque eu estava ali. As palavras têm poder, mas não é você mesmo que diz que guardar o que sente faz mal?  Então escreve que passa. Eu dizia e sentia. Mas é você quem me salva, me sa...